
Meus vinte e poucos (para mim, tantos) anos. Lembro-me de quando era criança. Do quanto queria crescer, poder sair para uma festa e voltar tarde da noite. Lembro-me que na minha primeira memorável saída pra uma Festinha de Dança da Vassoura ou de Garagem (para quem tem mais de 30, diz-se Reunião Dançante), voltei para casa à meia-noite, de calça boca de sino, sapato alto e blusa rendada, toda de preto, me achando uma pré-adolescente modernosa. Nesta época o “lance do ficar” começou a dar seus primeiros sinais.
– “Ficou com ele?” Perguntou uma menina enxerida na festa.
E eu, naturalmente: -“Sim”, não entendendo o nível de profundidade da pergunta.
- “Como era o beijo dele?” A menina curiosa perguntara.
- “Beijo? Pra ficar tem que beijar?” Respondi na minha eterna inocência que carrego até hoje. Eu apenas havia dançado com o aspirante à pré-adolescente o tema de O Guarda-Costas com Whitney Houston ou teria sido o tema de Titanic?
E são tantas as lembranças da minha geração que não brincou de rolimã, mas jogava taco com latinhas de óleo de cozinha. Que não ajudava os pais no trabalho, mas brincava de professora e dava bronca nas suas alunas de pano e plástico.
Ah, me lembro da minha coleção de Chuquinhas. Das bonecas que tinham cheiro de frutas. Do Pogobol. Do microfone com cabelo laranja da Xuxa. Dos ursinhos carinhosos (como eu sonhei em ter aquele carro de nuvem). Da tentativa minha e do meu primo de construir um super carro de madeira.
Tantas lembranças para minha pouca idade. O que vou lembrar aos 40? Que eu brincava de pagar as contas, da inflação, da alta do dólar?! Não vou me permitir falar disso.
Será que algum dia deixaremos de ser criança? Tomara que não.
Tomara que meu tio continue sua coleção de carrinhos, que meu primo continue construindo aviões de brinquedo, que meu avô continue dançando lá no céu.
Tomara que minha amiga continue se lambuzando ao tomar sorvete (essa foi pra você Rô) e brincando de casinha (mas agora de verdade).
Tomara que todos nós continuemos rindo de um grande tombo (do nosso e dos outros). Tomara que cada um de nós tenha uma inesquecível lembrança do que já passou. Nem que seja a perna de uma boneca ou uma cicatriz na testa.
Aproveite que a única cicatriz que nos lembra bons momentos são as da infância.
Nem que seja aquela lembrança mais antiga que temos do nosso passado.
A propósito, qual a lembrança mais caduca que você tem aí na sua mente? Difícil, não é mesmo?!
Num ímpeto de nostalgia, e em conversa com uma prima querida, me peguei, hoje, procurando o filme original que mais me fascinou na infância, Alice no País das Maravilhas.
Se algum dia eu quis ser Alice, não me lembro. E se algum dia eu deixarei de ser criança, ah, prefiro que este dia não chegue.
Miréille Almeida em campanha pela volta (em alguns momentos) da parte mais gostosa da vida: a infância.